15 de jun. de 2025

Os Tolos que Sonham

Postado por Fernando Assis às 16:31 0 comentários

 


Minha tia costumava morar em Paris.

Eu me lembro, ela costumava voltar para casa e nos contar histórias sobre estar no exterior.

E eu me lembro que ela nos contou que uma vez pulou no rio, descalça.

Ela sorriu… pulou, sem olhar,

e caiu no Sena.


A água estava congelante.

Ela passou um mês espirrando,

mas disse que faria tudo de novo.


Um brinde aos que sonham,

por mais tolos que possam parecer.

Um brinde aos corações que sofrem.

Um brinde à bagunça que fazemos.


Ela capturou um sentimento —

um céu sem teto,

um pôr do sol dentro de uma moldura.


Ela vivia na bebida,

e morreu com uma centelha.

Sempre vou lembrar da chama.


Um brinde aos que sonham,

por mais tolos que possam parecer.

Um brinde aos corações que sofrem.

Um brinde à bagunça que fazemos.


Ela me disse:

“Um pouco de loucura é essencial

para nos dar novas cores para enxergar.

Quem sabe aonde isso vai nos levar?

E é por isso que eles precisam de nós.”


Então tragam os rebeldes,

as ondas causadas pelas pedrinhas,

os pintores, e poetas, e peças de teatro.


E um brinde aos tolos que sonham,

por mais loucos que possam parecer.

Um brinde aos corações que se partem.

Um brinde à bagunça que fazemos.


Eu traço tudo de volta àquele momento —

Ela, a neve e o Sena,

sorrindo através de tudo.

Ela disse que faria tudo de novo.

15 de mai. de 2025

o ovo que ilumina?

Postado por Fernando Assis às 16:20 0 comentários


Nélio e eu vamos nos divorciar. Ele ficará com a casa — vai comprar a minha parte. Tenho para onde ir, tenho títulos acadêmicos e um trabalho. Mas… ainda assim, sinto uma tristeza no encerramento.


Já não vejo mais o Nélio de quatorze anos atrás. E é óbvio que eu também não sou mais o mesmo — ou talvez ainda seja, em partes. Mas ele se tornou alguém irreconhecível, e a minha mente insiste em me mostrar as promessas, as conversas, as tentativas. Eu juro: eu tentei. Sei que ele errou, eu também errei. Erramos — e também acertamos.


É estranho pensar que, quando um vizinho italiano faleceu e deixou sua companheira mergulhada numa escuridão total, com apenas uma luz no jardim refletindo sua silhueta sentada, pensativa… eu chorei. Chorei muito. Porque, de alguma forma, projetei naquela cena a ideia da morte e da solidão que senti diante da ausência do Nélio. O medo de perder aquilo que eu achava que tinha se traduziu em lágrimas.


Para mim, “divórcio” sempre foi uma palavra proibida. Nunca me casei pensando no fim. Talvez eu tenha romantizado, idealizado demais… Mas às vezes é melhor viver num sonho do que viver triste.


Hoje, sinto como se estivesse diante de um abismo — o mesmo que sempre temi — e agora me vejo pulando, ou sendo empurrado para dentro dele. Talvez outra pessoa se apaixone por esse novo Nélio, mas eu não posso mentir para o meu coração. Já não conseguia mais… e ainda não consigo.


Talvez seja egoísmo dizer que só eu tentei. Eu falei, me expressei com atos e palavras. Ele, por outro lado, se afundava no trabalho, celular e videogame. Tornou-se uma espécie de zumbi, um cadáver do namorado que um dia eu tive — e que hoje já não tenho mais. Quem sabe ele se encaixe perfeitamente com outra pessoa, desejo o melhor, de verdade.


O universo, de certa forma, me abraçou ao me apresentar o Armando. Já estamos há seis meses juntos, e estar com alguém que me trata com gentileza, escuta, desejo e tanto amor talvez seja exatamente o que eu precise neste momento.


São sombras, medos, o abandono de algo que eu achava que sempre estaria ali — como quando abrimos a torneira de manhã esperando que a água venha. Mas ela não vem. Já secou. É hora de caminhar mais uma vez.


Meu corpo ainda pede água. E eu até poderia me contentar com os fantasmas dessa água…  Talvez essa água esteja em mim. De qualquer forma, me escutei, senti que o Fernando pede o afeto de outras formas.


Outras águas, outras fontes, fogos, lugares, outros nascimentos; vejo a luz, talvez de um ovo, talvez.

 

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